Conspiração

— Não!

— Mas mãe...

— Nada de “mas”. Quando eu digo não é não!

Se fosse um dia normal, eu teria ido direto pro meu quarto e quase quebrado a porta com uma pancada. Mas nesse dia eu resolvi não fazer essa cena. Sabe que nem sei qual foi o motivo? Só não bati a porta. E ainda voltei pra sala, onde toda a discussão do por-que-não-posso-ir-pra-festa-mãe? aconteceu e foi quando eu vi. Aaah, aquele sorriso de cumplicidade que meu pai lhe ofereceu... Não, isso tava errado. “Será que meus pais são sádicos, meu Deus?”. Antes fossem. 

Já tava tudo armado: 00h30min meu amigo viria escondido com o carro do seu pai, eu faria nós em todos os meus lençóis e fugiria pela janela, fim de papo. Eu iria a festa sim, porque eu merecia e to nem aí se eles são os meus pais. Quem sabe o melhor pra mim sou eu!!!

— Tem certeza que eles vão tá dormindo?

— Tenho, velho! Eles dormem mó cedão.

— Olha lá, hein...

E olhei lá mesmo. O som do carro parando em frente a calçada daqui de casa foi o sinal verde pra que eu saísse de fininho do meu quarto e fosse espiar pra ver se meus pais estavam dormindo. Eu nunca havia feito algo assim antes, então estava bem nervoso, com muito medo de dar tudo errado, só que a porta do quarto dos meus pais até entreaberta estava. Na hora nem desconfiei da falta de obstáculo, na verdade fiquei bem agradecido, e conferi se os dois estavam dormindo. Parecia estar tudo sob controle, minha mãe roncava. Só que eu poderia jurar que ouvi risadinhas quando eu tava prestes a encostar a porta. Meu coração quase parou e eu espiei mais uma vez. Outro ronco. Cheguei à conclusão de que o nervosismo estava me fazendo ouvir coisas. “Quer saber? Se for pra me ferrar, eu me ferro. Falou vocês”. 

Atos de rebeldia são revigorantes até o momento em que há uma escada encostada bem na sua janela, quase que pedindo que você fuja de casa. Claro que fiquei chateado pela inutilidade que minha corda de lençóis adquiriu, mas não foi só isso. Essa escada geralmente fica na garagem e só o meu pai consegue carregar esse trambolho. O que ela tava fazendo encostada na minha janela? Huuum... 

Tive que voltar de fininho até o quarto dos meus pais, pois algo não cheirava bem. 

— Será que ele já foi? - ouvi a voz da minha mãe dizer, baixinho, mas audível.

— Acho que não. - meu pai respondeu preguiçoso.

Não, isso tava errado, muito errado. Desisti da fuga de tão intrigado que fiquei. 

Tudo teria ficado por isso mesmo se não fosse o episódio do acampamento. O combinado seriam 5 dias acampando e mãe-não-vou-ligar-porque-não-vai-ter-sinal-no-meio-da-mata. Quem diria que o incêndio ali próximo miaria nosso acampamento? 

Tive que voltar com dois dias de antecedência, sem avisar. Foi horrível quando entrei em casa e vi aquela grande roda, preenchida por todos os pais da rua, com um cartaz pendurado que dizia

PAIS CARETAS TÊM FILHOS MANEIROS 

Me senti enganado.